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Fragmentos da obra

Remexer no passado é semelhante a fazer uma limpeza em um cômodo da sua casa que estava abandonado há muito tempo. Podemos dizer até que era um local esquecido da casa, onde você só despejava toda a tralha. Quando pisa naquele espaço, não sabe por onde começar e, quando mexe na primeira coisa que encontra, levanta uma nuvem enorme de poeira.
Se, assim como eu, você tem rinite alérgica, esse início da limpeza causa uma crise de espirros. Uma baita crise de espirros. E agora, além de ter um cômodo sujo, você também tem a sua rinite atacada. Você até pensa em desistir e abandonar aquilo tudo, mas se lembra que precisa utilizar o espaço muito em breve. É parte da sua casa, não pode ficar abandonado e esquecido. Então, retorna à limpeza.
Como disse antes, mergulhar de cabeça em seu passado tem um efeito parecido. Você revisita uma parte sua que está sendo ignorada por algum motivo, mas, para que você possa amadurecer e mudar, será importante limpar e revirar. É preciso tirar a poeira das memórias e, em alguns casos, reviver dores que supostamente estavam esquecidas. Dói, incomoda, mas é necessário.
Quem nunca precisou fazer isso? Até aí tudo bem. Todos temos problemas e, às vezes, fugimos deles por algum tempo. No fundo, sabemos que um dia teremos que enfrentá-los novamente. Então, você sabe o que te espera. Quando o cômodo estiver limpo, a poeira vai embora e, com alguns remédios e um pouco de descanso, a rinite passa...
O problema é que sou uma escritora, não conto apenas as minhas experiências. O passado que preciso mexer não é meu, mas sim da minha mãe. Então, não tenho em mãos uma tarefa fácil. Não faço ideia do que vou encontrar neste lugar que ela abandonou sem fazer uma limpeza, me deixando apenas alguns contos e cartas nos quais pede desculpas para mim e meus irmãos. Tudo que consegui fazer foi escrever um livro, tendo como base aquilo que encontrei. Alice é apenas uma personagem e talvez não tenha nada a ver com Stephanie.
Além disso, a cada dia preciso mergulhar mais fundo nesse passado e descobrir quem era Stephanie Becker antes de se tornar uma escritora conhecida. Não sei o que vou decifrar e se posso resolver essa incógnita, porque, diferente de minha personagem Alice, minha mãe está morta há dez anos.